Sérgio Moro e Antonio Di Pietro – Fórum da Liberdade 2018

Oportunidade única que tive em abril/2018 de assistir presencialmente as ideias de Sérgio Moro e Antonio Di Pietro. Vale a síntese, leia 😉

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Profundamente aguardado, Sergio Moro teve uma entrada triunfal no palco em meio a muitos aplausos, gritos e coros como “Moro, Moro, Moro…”, dignos de torcida organizada, causando frisson em público mais seleto da Arena da Liberdade onde só entraram portadores de ingressos VIP. Foi de longe o palestrante mais ovacionado de todo o evento. Antonio Di Pietro, identificado como o “Moro da Itália” devido a ter atuado como juiz na Operação Mãos Limpas, também foi muito aplaudido e palestrou ao lado de Moro. Dê um a olhada no vídeo.

Sergio Moro

Moro iniciou fazendo colocações gerais, falando que a democracia brasileira está consolidada sem risco de retrocesso as instituições democráticas. Par ele, no momento atual, discursos de volta a ditatura ou afins são “fantasmas da gera fria”. Mesmo assim frisou que nossa democracia é de baixa qualidade com grandes desigualdades sócio econômicas com problemas de violência e segurança pública bem como um grave problema de corrupção. Falou que é um grande erro acharmos que não conseguimos resolver nossos problemas através dos mecanismos institucionais. Como exemplo de problema grave resolvido por mecanismos institucionais falou sobre economia relembrando os períodos de hiperinflação da história recente e de que parecia ser algo estrutural e aceitável na época e foi resolvido por políticas públicas. Também falou de programas de transferência de renda que tiverem impacto relevante na redução da pobreza. Posto isto, fez um paralelo na corrupção que, assim como a hiperinflação e a pobreza foram reduzidos por mecanismos institucionais, a corrupção também deve ser atacada da mesma forma.

Entrando mais na questão da corrupção, Moro menciona que o Brasil vive um problema da pequena e da grande corrupção, mas comenta que a sua percepção é de que a grande corrupção é maior, sendo esta espalhada e profunda. Relembrou o Mensalão que revelou a corrupção pela primeira vez em cores mais fortes e que a Lava Jato revela uma corrupção mais sistêmica como a “regra do jogo” e não como um caso isolado. Da mesma forma que a hiperinflação e pobreza pareciam ser algo natural e forma mitigados, a corrução também pode. Não se pode ter uma reação fraca e conformada pois não é algo natural da nossa realidade.

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Moro narrou detalhes de como funciona a corrupção sistêmica, onde poderosos diretores de estatais participavam, empresários que burlavam as regras de mercado para conseguir contratos, que por sua vez pagavam sistematicamente vantagens indevidas a agentes públicos que e igualmente agentes políticos se beneficiavam. Reforçou que vários destes atores foram processados, condenados e presos demonstrando que este ciclo pode ser quebrado. Contudo, mencionou que não há uma eficiência perfeita da justiça e de que estes crimes são difíceis de serem descobertos, e uma vez descobertos são difíceis de serem provados com uma prova categórica e, mesmo quando provado, o sistema de justiça não tem uma eficiência que garanta a prisão mesmo após provado o crime de forma adequada. Mas, em linhas gerais, há um aumento na eficiência do combate a corrupção e de que com isto há uma expectativa de redução da corrupção com a diminuição da impunidade.

Moro menciona que não se pode ter a expectativa que a operação Lava Jato vá acabar com a corrupção. Da mesma forma que as políticas públicas contra inflação e pobreza só as reduziram a níveis mais razoáveis, os casos atuais de combate a corrupção tem um efeito prático e mandam uma mensagem forte. A Lava Jato e outros casos que surgirão terão um fim. O importante é que alcancemos um novo patamar de eficiência da justiça erguendo o patamar para as próximas gerações. De igual forma fortalecer as instituições com um governo de leis e não de interesses especiais de alguns em detrimento do interesse público.

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Sobre a discussão recente da presunção da inocência no STF, Moro mencionou os avanços e disse que não se pode confundir presunção de inocência com garantia de impunidade dos poderosos. Moro disse que é juiz desde 1996 com foco criminal desde 2006 e que viu muitos processos passarem por suas mãos, em que havia provas evidentes, mas viraram pó por conta da exigência de esperar o trânsito em julgado. Falou que é importante a questão da presunção de inocência, mas que, na prática, ele é desastroso pois o sistema pode ser manipulado em parte desde que o condenado possa contar hábeis advogados que possam postergar o final do processo por décadas até prescrição da ação. Como exemplo, falou de um caso específico em 2009 quando o STF mudou o entendimento da presunção de inocência e entendeu que era necessário o trânsito em julgado, concedendo um Habeas Corpus a um condenado em 1ª e 2ª instâncias por homicídio. Ele conseguiu manipular a justiça por 12 anos com múltiplos recursos até prescrever a ação. O condenado, independentemente de ser inocente ou culpado, ganhou pela prescrição e não por ser inocente ou culpado, ganhou não pela decisão da justiça, mas por inércia.

Moro defendeu a prisão após condenação em 2ª instância em todos os casos pois, mesmos nestes casos, ainda há instrumentos legais que permitem Habeas Corpus se identificado que é plausível alguma falha específica no processo em questão. Como exemplo mencionou o julgamento no STF sobre o Habeas Corpus de Lula onde o voto do Ministro Barroso que mencionou que apenas 1% dos recursos remetidos a instâncias superiores são providos e, mesmo permitindo condenação em 2ª instância, continuam podendo ter Habeas Corpus conforme mencionado e, portanto, não tem sentido obstruir todo o sistema judiciário até o trânsito em julgado. Moro aproveitou para arrancar alguns risos da plateia ao comentar o voto da Ministra Rosa Weber que é mais conservadora ao não falar com a imprensa e que todos os demais juízes, inclusive ele, estão errados. Depois arrancou aplausos ao mencionar que a ministra optou pela coerência com a jurisprudência ao não mudar o voto ao sabor do acaso.

Por último, Moro fez um apelo ao setor privado pois a corrupção ocorre em parceria público-privada. Exaltou o papel do setor privado por ter um dinamismo maior e permeabilidade a mudanças para poder combater a corrupção. Não se pode esperar que somente a justiça e o governo lutem contra a corrupção e que o setor privado tem uma grande oportunidade dizendo não ao pagamento de propina. Além disso, trouxe exemplos de consequências financeiras vividas pelas empresas descobertas em casos de corrupção. Também falou que, nos casos que julgou, não havia extorsão pro parte do setor público para cobrar propina das empresas, mas sim uma simbiose de ambos os dados.

Moro finaliza dizendo que precisamos melhorar a qualidade de nossa democracia no dia a dia e com trabalho duro.

Antonio Di Pietro

Ex-magistrado do Ministério Público – Promotor, advogado e político italiano. Como juiz, atuou na Operação Mãos Limpas na década de 90 em um papel semelhante ao de Sergio Moro hoje. No evento ele foi descrito como “Sergio Moro da Itália”.

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Com discurso todo em italiano, Pietro falou sobre as dificuldade enfrentadas pela Operação Mãos Limpas e das suas como magistrado. De forma inevitável, paralelos entre ele e Moro e da Mãos Limpas com a Lava Jato estiveram presentes o tempo todo. Como juiz, Pietro mencionou a violência que ele enfrentou devido a máfia italiana. Muitos de seus pares foram assassinados, alguns com atentados à bomba, mas ele sobreviveu. Também sofre ataques por meio de acusações ao ponto de sofrer processos infundados de suspeita de ser um gente da CIA infiltrado, o que o abalou bastante na época. Sobre a operação Mãos Limpas, havia o cerceamento de alguns meios de comunicação manipulando a opinião pública pois a informação não era livre como hoje na internet. Também houve forte pressão política ao ponto de ocorrerem mudanças na legislação para simplesmente deixar de caracterizar como crime muitos atos ilícitos, como fraldar um balanço financeiro, por exemplo.

Pietro fez paralelos traçando algumas diferenças entre o nosso momento e o vivido por ele na Itália. No caso brasileiro são somente 2 agentes: o privado e o público, onde o privado financia o público; já no caso italiano havia um terceiro agente chamado Máfia que financiava os dois primeiros. Devido a Máfia surge outra diferença: a violência. Cada agente ou colaborador próximo da operação Mãos Limpas era simplesmente assassinado inclusive com casos de atentados à bomba. Pietro se considera um sobrevivente. A terceira diferença é quando a informação. Mesmo havendo liberdade de expressão na época, a informação trafegava basicamente pelos meios de comunicação existentes e era manipulada para colocar a opinião pública contra e ajudar a passar leis mais brandas livrando corruptos legitimando seus atos. Pietro, e depois Moro reafirma, que o mesmo só não ocorreu no Brasil devido a internet que permite a troca de informação horizontal sem manipulação de um pequeno grupo instituições a seu favor, e por consequência a sensibilização do brasileiro vista por meio de protestos. Foi mencionado também o efeito colateral recente que são as “Fake News”.

Por fim, Pietro menciona os impactos políticos profundos gerados pela Operação Mãos Limpas ao ponto de reduzir o poder dos partidos políticos que dominavam o cenário italiano. Todos os quatro partidos no governo no início dos anos 90 acabaram desaparecendo de algum modo. Somente três partidos sobreviveram de algum modo, mas apenas o Partido Republicano manteve a sua denominação.

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No final houve um bloco de perguntas onde Moro voltou em temas já abordados mas tocou no papel da imprensa e da grande cobertura da Lava Jato. Falou da importância da imprensa em noticiar os fatos e de que, até então, a imprensa tem ajudado a mobilizar a opinião pública em favor da Lava Jato, embora as “Fake News” sejam um problema. Já Pietro voltou a temas sobre a violência excessiva da Máfia e das baixas sofridas com a morte de muitos pares de seus os quais ele enumerou pelo nome e também sobre a importância da informação horizontal da internet para impedir a manipulação da opinião pública. Abaixo vídeo com perguntas e respostas a Sergio Moro Antonio Di Pietro (Pietro falando em Italiano).

 Eu e Marcelo Assumpção

Agradeço o convite para o Fórum da Liberdade 2018, feito pelo meu amigo e colega Marcelo Assumpção. Parceria para todos os dias do fórum 😉

Ao fundo Antonio Di Pietro, Eduardo Wolf e Sergio Moro.

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Entusiasta de tecnologia, desenvolvimento de software, cultura geek, negócios e TI.

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